Se primeiramente os cultos
afro-brasileiros representavam a resistência cultural e religiosa dos negros
africanos que para aqui vieram escravizados, e posteriormente dos seus
descendentes, aos poucos foram cedendo espaço á sociedade branca e cristã, mais
poderosa, que acabou resultando em religiões sem cunhos étnicos, raciais,
geográficos e de classes sociais, que tinham que competir no mercado religioso,
por fiéis, reconhecimento e legitimidade.
Dessa forma, ao romper do século XX,
nasceu uma nova religião no Rio de Janeiro, a Umbanda, inspirada nas antigas Macumbas cariocas, na Cabula e no Omolokô,
na esteira dos escravos recém-libertados que iam para o Rio de Janeiro, então
capital federal, em busca de trabalho no cais do porto; influenciada pelo
Espiritismo kardecista, que aportava
no Brasil, nas cabeças dos filhos de famílias abastadas após o término de seus
estudos na França.
E assim, a Umbanda disseminou-se em todo o Brasil, sendo a
grande religião brasileira, reproduzindo a formação da nossa sociedade mestiça,
mesclando o catolicismo dos brancos, os Orixás dos negros e a espiritualidade e
rituais dos indígenas.
Mas, desde a assunção da Umbanda, no plano
terreno, ocorrida em 1908, por obra do Pai Zélio Fernandino de Moraes e do
Caboclo das Sete Encruzilhadas muita coisa mudou em nosso país, mudanças que
foram sentidas também nas religiões, com novas formas de buscar o religare, convivendo com antigas;
algumas se mantendo intocáveis, outras se modernizando, acompanhando usos e
costumes; ou mesmo assumindo novas roupagens que lhe são impostas por novas
lideranças.
No seu início, a nova religião
denominou-se Espiritismo de Umbanda, e até hoje ainda muitos Umbandistas se
denominam espíritas, além disso, a Umbanda não só conservou o sincretismo
católico, como assimilou preces, devoções e valores católicos, se constituindo
na mais católica das religiões com matiz africano.
Um fato muito comum, talvez como reação
a essa proximidade com o catolicismo é a conversão de Umbandistas ao Candomblé,
isso ao invés de fortalecer a sua identidade religiosa umbandista, acaba
criando uma confusão tal, que muitos acabam abandonando a Umbanda
definitivamente.
A característica marcante da Umbanda é
a reunião de pequenos grupos de pessoas, que se unem em torno de um dirigente,
mãe ou pai de santo, que embora tenha sido formado por outro (a) mãe ou pai de
santo, ao imprimir as suas características pessoais, saberes e personalidade,
forma um terreiro diferente daquele que lhe deu origem, autônomo e
independente, com pouca - geralmente em festas -, ou nenhuma relação com outros
grupos.
Dessa realidade pode-se concluir que
não existe uma organização institucional capaz de unificar os terreiros, uma
vez que mesmo litúrgica e ritualisticamente, grosso modo, não existem dois
terreiros de Umbanda iguais, tornando-se muito difícil o estabelecimento de
projetos e estratégias comuns, tanto no aspecto religioso, quanto na relação
com a sociedade.
As federações de Umbanda, via de regra
agrupam também Ilês do Candomblé, e Templos de outras religiões, dividindo a
força representativa, e muitas delas existem única e exclusivamente para o
benefício particular dos seus dirigentes, nada realizando em prol da Umbanda.
Aquelas que pretendem realizar alguma coisa sofrem primeiro com o descaso e
reação ao termo federação; com a falta de disponibilidade de pessoas,
totalmente consumidas pelas suas atividades laborais e a administração dos
terreiros; e pela falta de recursos financeiros.
Assim, fragmentados em pequenos grupos,
vivencia-se certa concorrência entre os terreiros, não se atua na via
institucional, e inexiste uma estratégia política de centralização de ações de
frente ampla. Com raríssimas exceções, em plena era da comunicação, ainda
vive-se a tradição da transmissão oral dos conhecimentos, o que nos torna alvo
fácil para o ataque de outras religiões mais modernizadas, bem estruturadas
financeiramente, que organizadas nacionalmente, estabelecem relações muitas
vezes equivocadas com o poder central do estado, cuja laicidade é letra morta
na Constituição Federal, se fortalecendo cada vez mais.
A FUEP – Federação Umbandista do
Estado do Paraná, a partir da atualização do Estatuto Social realizada em 2009,
tem por finalidade primeira e maior, congregar e representar institucionalmente
os Templos Religiosos
Umbandistas (Associações, Cabanas, Centros, Tendas, Terreiros e demais
denominações), seus dirigentes, médiuns e frequentadores na busca da legitimação e do fortalecimento da
Umbanda.
Essa finalidade, bem
como os princípios gerais, encontra-se no Capítulo II, Das Finalidades, Artigo
3°:
ARTIGO 3º - A FUEP tem por finalidades:
I –
Congregar e representar os Templos Religiosos Umbandistas (Associações,
Cabanas, Centros, Tendas, Terreiros e demais denominações), seus médiuns e
frequentadores, associados nos termos do presente Estatuto, com os princípios
Morais, Filosóficos, Doutrinários e Religiosos da Umbanda, promovendo a mais
estreita harmonia e fraternidade, respeitando a diversidade das formas de culto,
e os seguintes princípios gerais:
·
Não realizar em hipótese alguma o sacrifício
ritualístico de animais.
·
Não
cobrar pelas consultas, atendimentos e trabalhos, a Umbanda é caridade;
·
Respeitar
o livre-arbítrio das criaturas, não realizando qualquer ação que implique em
malefício ou prejuízo a alguém;
·
Preservar
e respeitar a natureza do planeta;
Assim, o Estatuto
Social, estabelece quem a FUEP representa e quais os princípios devem ser
observados no sentido de estabelecer essa representação. Logicamente não se
exclui a possibilidade de encampar políticas mais amplas, de forma pontual, em
conjunto com os demais segmentos religiosos e movimentos sociais existentes no
país.
Sabe-se que,
atualmente, existem alguns grupos que ocupam papel destacado no cenário nacional,
dos quais dois são mais conhecidos, liderados por dirigentes conhecidíssimos
por todos os Umbandistas e demais seguidores de religiões afro-brasileiras, são
eles: Pai Rivas Neto e Pai Rubens Saraceni. Ambos se postulam representantes
dos mesmos objetivos e princípios e apresentam vários pontos positivos,
notadamente com relação à visibilidade da Umbanda e dos demais cultos
afro-brasileiros, que atinge proporções nunca vistas. Mas, mesmo com todos
esses pontos positivos, não conseguem ou não tem interesse em realizar ações
conjuntas, por motivos que efetivamente se desconhece, uma vez que não se
participa desses grupos.
Dessa forma,
emerge a necessidade de uma efetiva proposição de articulação nacional com o
objetivo de buscar o reconhecimento e legitimação da Umbanda como religião.
É necessário também e
urgente dar um norte para o futuro da Umbanda, evitando utilização do nome da
Umbanda em atividades que buscam somente a utilização do seu nome por
aproveitadores da Fé das pessoas, extorquindo valores para a realização de
trabalhos que ferem os princípios morais, éticos, cármicos e o livre-arbítrio. É
preciso dar
uma basta aos mistificadores, que através de anúncios em postes, ou com
verdadeiras arapucas, se utilizam do nome da Umbanda para ganhar dinheiro dos mais
incautos.
Deve se ter a
preocupação com a Umbanda que será deixada para as gerações futuras de
umbandistas, se essa que é alvo de discriminação e preconceito, ou uma religião
que as pessoas possam assumir sem o medo de represálias e perseguição.
Curitiba, capital
do estado, foi a precursora em reconhecer e o estado do Paraná um dos poucos
que reconhece oficialmente o dia 15 de novembro como o “Dia da Umbanda e dos
Umbandistas”, data que já foi reconhecida nacionalmente pelo estado brasileiro.
Ainda
assim, as represálias e perseguição são sentidas também aqui, tendo em vista,
talvez, o processo civilizatório do estado que apresenta a população negra com
pequena proporção numérica e indicadores invejáveis de renda e qualidade de
vida.
A Umbanda tem pouca aceitação pelas
populações de alta renda, acredita-se que por estarem vinculadas as questões
que remetem ainda ao tempo da escravidão, embora se note, à partir das
comemorações do 1° Centenário em 2008, uma mobilização e um aumento da quantidade
de templos, dos fiéis e dos frequentadores.
Tendo como certo que a melhor maneira de
combater a discriminação e o preconceito é a conscientização e o
esclarecimento, é cada vez mais necessária a integração dos Umbandistas entre
si e com a sociedade, numa articulação que inicie localmente, avance para a
regional e se estabeleça nacionalmente, de forma a unificar a mobilização dos
Umbandistas, pelo reconhecimento efetivo e legitimação da sua religião.
É importante perceber que não se quer
dividir, acredita-se na diversidade de ritos como a grande riqueza da Umbanda,
ao contrário, entende-se necessário articular os Umbandistas para a definição
da sua identidade religiosa, esclarecendo, tanto interna, para os Umbandistas,
quanto externamente para o conjunto da sociedade, o que é a religião de
Umbanda.
Dado esse pressuposto, tomou-se conhecimento
da proposta do Movimento Político Umbandista, surgido inicialmente em São
Paulo, que já se articula em vários estados do Brasil, que se propõe a
organizar em 2014 o Congresso Nacional da Umbanda, onde seria discutida e
aprovada a Carta Magna da Umbanda, documento que se propõe a estabelecer essa
identidade à partir de pontos que já são comuns aos Templos Umbandistas em
atividade, baseadas nas orientações emanadas do Médium Zélio Fernandino de
Morais e do Caboclo das Sete Encruzilhadas, pontos que também são princípios
norteadores da FUEP.
Constatada essa convergência, convocou-se o 3° Seminário de
Cultura e Cidadania Umbandista do Estado do Paraná, com o objetivo de conhecer
o Movimento Político Umbandista, a proposta do Congresso Nacional da Umbanda e
a pauta da Carta Magna da Umbanda.
Que nos valha o Cristo Jesus, o Oxalá da
nossa Umbanda!
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